Aposentados e pensionistas do Instituto Nacional do Seguro Social (INSS) enfrentam uma nova e silenciosa ameaça à sua segurança financeira.
Antes, o problema eram os descontos associativos na folha de pagamento. Agora, uma nova tática causa prejuízos de forma mais sutil. São débitos automáticos não autorizados. Eles acontecem diretamente na conta bancária do aposentado. A retirada do dinheiro ocorre logo após o crédito do benefício.
Essa prática levanta um sério debate sobre a proteção de dados e a vulnerabilidade dos idosos.
A evolução da fraude: dos descontos do INSS em folha para o débito em conta
Se antes a preocupação central eram os descontos do INSS realizados por associações e sindicatos diretamente no benefício, a fraude evoluiu.
Agora, sociedades de crédito, clubes de benefícios e algumas instituições financeiras adotaram um método diferente. Em vez de dependerem da intermediação do INSS, essas empresas efetuam débitos automáticos diretamente na conta corrente do beneficiário.
A tática é a mesma: cobrar por serviços não contratados. Pequenos valores, frequentemente em torno de R$ 70,00, são debitados mensalmente. Por ser uma quantia relativamente baixa, muitos aposentados, especialmente aqueles com menor controle sobre suas finanças ou que recebem valores mais altos, podem não perceber a subtração por meses.
A grande diferença envolve a responsabilidade. Antes, a crítica recaía sobre o INSS por permitir deduções indevidas em sua folha de pagamento. Nessa nova modalidade, a atenção se volta para as instituições bancárias.
Assim como o INSS foi acusado de omissão, os bancos agora são questionados por permitirem que empresas parceiras ou vinculadas realizem débitos sem a devida e clara autorização do correntista.
O mais preocupante é: tanto o INSS quanto os grandes bancos parecem não se importar com os descontos irregulares que afligem seus clientes mais vulneráveis.
A violação da autonomia e a vulnerabilidade do idoso
O prejuízo financeiro é apenas uma faceta do problema. A questão mais grave é a violação do direito fundamental do idoso de tomar suas próprias decisões financeiras. A eficácia desses golpes está diretamente ligada à exploração consciente da condição de vulnerabilidade dos aposentados.
Muitas empresas mal-intencionadas não apenas conhecem as dificuldades desse grupo, mas as utilizam como estratégia de negócio. Essa triste realidade é perfeitamente descrita pelo advogado e mestre em Direito Previdenciário, Rômulo Saraiva. Ele pontua para o portal Folha de São Paulo:

“Um idoso pode ser considerado vulnerável por várias razões, como analfabetismo, limitações físicas ou cognitivas, isolamento social e dificuldade tecnológica. Inevitavelmente, esse público está propenso a golpes e abusos. Por idênticas razões, têm dificuldade de se defenderem rapidamente. Ciente dessas peculiaridades, infelizmente muitas empresas atuam para tirar proveito dessa situação”.
O cenário legislativo e as empresas no radar
Em resposta ao problema crônico dos descontos associativos, tramita no Congresso Nacional o Projeto de Lei nº 1.846, de 2025. Proposto pelo deputado Sidney Leite (PSD-AM), o projeto visa proibir o INSS de atuar como intermediário para a cobrança de mensalidades de associações, uma medida que busca cortar o mal pela raiz e reduzir drasticamente o risco de fraudes.
Contudo, mesmo que o projeto seja aprovado e se torne lei, a paz dos aposentados não está garantida. A nova modalidade de débito em conta corrente mostra que o ecossistema de fraudes é resiliente e se adapta, encontrando novas brechas para explorar.
Dados do Conselho Nacional de Justiça (CNJ) acendem um alerta sobre a escala do problema. Duas empresas, em particular, destacam-se pelo volume impressionante de processos judiciais envolvendo descontos não autorizados em contas de aposentados:
- Aspecir Previdência: Com mais de 14.000 ações judiciais, a empresa oferece um portfólio variado que inclui seguros de vida, auxílio funeral, assistência pet e residencial, além de descontos em farmácias.
- Paulista Serviços (Pserv): Superando a marca de 15.000 processos, a Pserv atua como intermediária de cobranças para diversas empresas, incluindo seguradoras e associações.
Embora ambas as empresas neguem publicamente qualquer irregularidade, o volume de reclamações no Judiciário e em plataformas de defesa do consumidor conta uma história diferente. A questão fundamental não é a legalidade dos serviços oferecidos, mas a ausência de contratação e consentimento explícito por parte do aposentado.
FAQ – Perguntas Frequentes sobre Descontos do INSS
O que é essa nova modalidade de desconto que ameaça os aposentados?

Trata-se de débitos automáticos realizados por empresas (como sociedades de crédito e clubes de benefícios) diretamente na conta bancária do aposentado, logo após o crédito do benefício do INSS. Diferente dos descontos em folha, estes ocorrem sem a intermediação do INSS e sem a autorização do titular da conta.
Qual a diferença entre este novo desconto e os descontos de associações?
A principal diferença é o local da cobrança. Os descontos de associações eram feitos diretamente na folha de pagamento do INSS, antes mesmo de o dinheiro chegar ao aposentado. O novo golpe ocorre através de débito automático na conta corrente, com a aparente conivência dos bancos que permitem a cobrança.
Suspeito que estou sofrendo um desconto indevido. O que devo fazer?

Primeiramente, verifique seu extrato bancário detalhado para identificar qualquer débito não reconhecido. Anote o nome da empresa e o valor. Em seguida, entre em contato imediatamente com o seu banco para solicitar o bloqueio do débito e o estorno dos valores. Você também pode registrar uma reclamação no portal Consumidor.gov.br e, se necessário, buscar o auxílio de um advogado ou da Defensoria Pública para ingressar com uma ação judicial.
Como posso me prevenir contra esses descontos do INSS e outras fraudes?
A prevenção é fundamental. Monitore seu extrato bancário regularmente. Nunca compartilhe seus dados pessoais, senhas ou informações do cartão por telefone, mensagem ou e-mail. Desconfie de ofertas de serviços muito vantajosas e nunca assine documentos sem ler e entender completamente do que se trata. Ativar alertas por SMS ou aplicativo para cada transação em sua conta também é uma ótima medida de segurança.
Existe alguma lei que me protege desses descontos?
Sim. O Código de Defesa do Consumidor proíbe cobranças por serviços não solicitados. Além disso, o Projeto de Lei nº 1.846, de 2025, está em tramitação para coibir a prática de descontos de associações na fonte, embora não resolva diretamente o problema do débito em conta. A violação dos direitos do idoso também é protegida pelo Estatuto do Idoso.
Quem é responsável por esses descontos: o INSS ou o Banco?

No caso dos débitos automáticos não autorizados em conta corrente, a responsabilidade principal recai sobre a instituição financeira (o banco), que não deveria permitir a cobrança sem a autorização expressa do cliente. O INSS era o principal responsável nos casos de descontos feitos diretamente na folha de pagamento.